Contrato de Compra e Venda Não Registrado Dá Direito à Usucapião?
Introdução
Muitas pessoas adquirem um imóvel por meio de contrato de compra e venda particular, mas por diversas razões acabam não registrando esse contrato na matrícula do imóvel. Com o passar dos anos, surge a dúvida: é possível regularizar esse imóvel por usucapião mesmo sem o registro?
Essa situação é extremamente comum no Brasil e envolve aspectos legais importantes, especialmente no que diz respeito à posse e à intenção de adquirir a propriedade (ânimo de dono).
Neste artigo, você vai entender quando o contrato de compra e venda não registrado pode servir como base para um pedido de usucapião e quais são os cuidados e requisitos exigidos.
Qual a diferença entre posse e propriedade?
Antes de avançar, é importante distinguir dois conceitos fundamentais no Direito Imobiliário:
- Propriedade: direito real que só é adquirido com o registro da escritura pública na matrícula do imóvel (art. 1.245 do Código Civil).
- Posse: exercício de fato sobre o imóvel, com aparência de dono, ainda que sem o título registrado.
Logo, quem possui apenas um contrato particular de compra e venda não registrado ainda não é legalmente proprietário, mas pode ser possuidor, o que abre a possibilidade de, com o tempo, requerer a usucapião — desde que preenchidos os requisitos legais.
É possível pedir usucapião com base em contrato de compra e venda não registrado?
Sim, é possível. Mas depende das circunstâncias do caso.
A jurisprudência já reconhece que o contrato de compra e venda não registrado pode ser aceito como início de prova da posse com ânimo de dono, desde que a posse seja:
- Mansa e pacífica (sem oposição do antigo proprietário ou de terceiros);
- Ininterrupta (sem interrupções durante o período exigido);
- Com ânimo de dono (comportando-se como se fosse o verdadeiro proprietário);
- Pelo tempo exigido em lei (geralmente 10 anos, podendo ser reduzido em alguns casos).
Esse contrato serve como comprovação de que a pessoa entrou no imóvel com intenção de adquiri-lo, ainda que não tenha formalizado a transferência da propriedade via escritura pública e registro.
O que diz a lei sobre o caso?
O Código Civil brasileiro estabelece no art. 1.238 e seguintes os fundamentos da usucapião extraordinária e ordinária. Já o art. 1.245, §1º reforça que “enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel”.
Ou seja, o registro é essencial para transferência da propriedade, mas a posse adquirida com o contrato pode ser reconhecida como válida para fins de usucapião, desde que acompanhada de outros elementos probatórios.
Quais documentos podem fortalecer o pedido de usucapião?
Além do contrato de compra e venda, o requerente deverá apresentar provas da posse com ânimo de dono, tais como:
- Contas de luz, água, IPTU no nome do possuidor;
- Comprovantes de reformas ou benfeitorias no imóvel;
- Declarações de vizinhos e testemunhas que confirmem a posse por longo período;
- Fotos e vídeos que mostrem o uso contínuo do imóvel;
- Ausência de oposição do vendedor ou de terceiros.
O que fazer quando o vendedor faleceu ou não pode mais ser localizado?
Essa é uma das principais razões pelas quais compradores buscam a usucapião. Quando o vendedor falece ou desaparece, fica impossível concluir o processo de escritura pública e registro. Nesses casos, a usucapião se torna a única via viável para regularizar o imóvel, desde que os requisitos estejam preenchidos.
Qual o tipo de usucapião mais indicado nesses casos?
Geralmente, a usucapião ordinária é a mais aplicável quando existe um contrato de compra e venda como título de origem da posse. Ela exige:
- Posse contínua e pacífica por pelo menos 10 anos;
- Justo título (como o contrato) e boa-fé.
Se o prazo for maior (15 anos) e não houver título ou boa-fé comprovada, pode-se recorrer à usucapião extraordinária.
Conclusão
O contrato de compra e venda não registrado não transfere a propriedade do imóvel, mas pode sim fundamentar um pedido de usucapião, desde que o possuidor comprove que exerceu a posse como verdadeiro dono, de forma pacífica, ininterrupta e por tempo suficiente.
Se você está nessa situação, não permaneça na informalidade. Regularizar o imóvel por usucapião pode garantir segurança jurídica e valorização patrimonial.